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Com sua licença, falemos do Futebol da Bahia

por Leonardo Romeiro (Advogado e Torcedor)* em 19 de Maio de 2021 20:31

Eu queria, de fato, não falar sobre futebol. Eu apenas queria partilhar das dores inerentes às mais de quatrocentas mil mortes pela Covid-19; esperava que a bola não rolasse enquanto perdurasse a pandemia; imaginei não ver um desrespeito à fila de vacinação para que um mero entretenimento fosse assegurado.

Eu queria agora tão somente criticar as tristes falas da “CPI da COVID-19”, com a infeliz proteção, por alguns, de atitudes indefensáveis. Queria falar da retomada da fome e da miséria no Brasil, da mentirosa disputa entre vida e economia, mas não: o futebol da Bahia nos obriga a falar sobre ele.

Vencedor da Copa do Nordeste, apesar de um início de temporada de altos e baixos, o Bahia provoca em seus torcedores, especialmente à “geração Fast Clube”, nesses momentos de sucesso, certo saudosismo daqueles tempos menos gloriosos, ou uma busca das razões que lhes fizeram sustentar tanta paixão pelo Clube.

É impossível, caro leitor tricolor, não pensar no quanto foi sofrido perder para o Paulista naquele último jogo de 2005, ter que torcer para o Colo-Colo na final do baiano, ser goleado pelo Ferroviário e ainda perder para o Ipatinga em 2006: como foi difícil ver o Bahia penar dois anos numa amarga e sofrida Série C do Campeonato Brasileiro.

Entretanto, não só de dores se viveu esse amarga fase. Inegavelmente, jamais poderá ser esquecido aquele gol de Sorato contra o Ananindeua, ou mesmo o último gol do Bahia e de Ávine na velha Fonte Nova, naquele 3x0 sobre o ABC, ambos os jogos com estádio lotado. Como se esquecer da dupla formada por Moré e por Nonato e, principalmente, do gol de Charles “pé de coelho,” aos 49 minutos do segundo tempo?

Apesar do período espinhoso e da inexplicável classificação ao octogonal final em 2007, o que mais marcou foi a força da torcida tricolor, pois o orgulho de vestir a camisa azul, vermelha e branca nunca desapareceu.  Nesse tempo, houve a capacidade de reconhecer as limitações da equipe, mas, ainda assim, um ímpeto para defendê-la e acreditar que um futuro melhor estaria a vir. A torcida do Bahia jamais deixou de querer o Bahia.

E o sentimento de saber que o Clube, de fato, é seu, se consolidou em 2006, quando cerca de 50.000 (cinquenta mil) torcedores se dirigiram ao Campo Grande, para caminhar à Castro Alves, com o intuito de reivindicar o Bahia para si e, a partir dali, iniciar o processo de retomada do Clube, que se consagraria com a democratização.

Foi a torcida do Bahia quem fez o Bahia subir, foi a torcida do Bahia quem decidiu que o Bahia percorreria por outros rumos. Por isso, em momentos de sucesso, inevitavelmente, o saudosismo ressurge. Resultados positivos são importantes, mas para aqueles que seguem o esquadrão, parece que importa mais o comportamento do Clube, a história que ele percorre; parece que esse torcedor espera mais é que o Bahia continue sendo seu, pois, de alguma maneira, a torcida se sente - e é - parte integrante e fundamental do Bahia e não abre mão dessa condição.

Para ratificar esse comportamento, basta lembrar as fortes críticas feitas ao elenco do primeiro semestre de 2020 que, apesar de chegar à final da Copa do Nordeste e ser campeão baiano, não agradava ao torcedor, pois não lhe permitia se ver dentro de campo. Se faltou raça e vontade em algum momento, o torcedor bateu pé firme e, da sua forma, buscou outro Bahia, o que ele queria ver em campo; um Bahia em que ele pudesse se ver.

O título vencido no último dia 8 de maio é fruto da ótima gestão do Presidente Bellintani - que mais uma vez acerta ao criticar o calendário da FBF, ressalte-se -, do ótimo comportamento desse atual elenco e da comissão técnica, mas, sem dúvidas, é fruto desse jeito da torcida, de jamais aceitar o pouco, de nunca deixar de reivindicar o Bahia que ela quer.

Por outro lado, o grande rival do Tricolor revive dificuldades já sofridas no ano de 2005, com o rebaixamento à série C, e 2006, com a perda da final do baiano ao Colo-Colo. Obviamente, a queda para a série C ainda não ocorreu no presente ano, mas, infelizmente, parece próxima, se a análise for feita a partir da história do clube.

Assim como em 2005, observa-se especialmente no torcedor rubro-negro certo descrédito e afastamento do time, uma dificuldade em falar sobre o assunto futebol e, certamente, se fosse possível, pouco interesse em dirigir-se ao estádio Barradão.

A torcida do Vitória não consegue neste momento se identificar com o seu clube, pois não se enxerga nas posturas do campo e, principalmente, dos camarotes.

Não se verá um fiel torcedor aos goles alcoólicos e risos, por exemplo, enquanto a equipe sofre contra frágeis adversários do campeonato baiano. Não se verá um torcedor, de maneira boquirrota, ofender outrem, ao invés de reconhecer as fragilidades da equipe e buscar adequadas soluções para que seja possível alcançar o engrandecimento do seu time.

É preciso que os rubro-negros, assim como fizeram em tempos recentes, voltem a querer um Vitória do seu jeito, para assim reformular o clube, conforme as próprias vontades, sem abrir mão da conquistada democracia, olhando ao passado para relembrar as suas vitórias, mas se afastando de certas práticas, em busca de um novo e totalmente distinto futuro.

*Leonardo Romeiro é advogado, amante do futebol e atento ao mundo oculto da bola.

Foto: Pietro Carpi / ECV


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